quarta-feira, 20 de maio de 2015

Inveja da Magia

Fiquei parado. Olhando aquele desenho feito em giz no quadro negro da sala de minha esposa. Uma fada. Silhueta longilínea, com o braço estendido e segurando uma vara de condão. Vestido esvoaçante. Pernas longas com uma sapatilha aos pés. Lindo. Até os borrões de uma tentativa de apagar o giz parecia uma mágica a criar uma nuvem em frente à fada. Haviam tantos detalhes. Laços. Fitas que enlaçavam as pernas. Cabelos. Absorto em meus pensamentos diante daquele desenho. Pensei como sou. Sou das exatas. Sou do lógico. Sou das coisas retas, das linhas, dos círculos e dos ângulos. Ainda que as curvas suaves sejam infinitas retas que se somam. Fico preso naquelas atômicas retazinhas. Como se a beleza das formas não fossem apenas círculos e ângulos geométricos. Sinto inveja. Não tenho o dom das cores. Não tenho o olhar dos mestres e pintores. Não tenho o ouvido dos músicos. Apenas sinto a beleza das notas, das vozes e da harmonia. Como eles conseguem? Eu não sou harmônico. Meus dedos se atrapalham nas teclas e nas cordas. Também nos lápis e pincéis. Sequer sei batucar em rítmo. Sou um metrônomo quebrado. Invejo os pintores e suas pinturas nos quadros. Mesmo aqueles que parecem rabiscar sem sentido. E voilà, surge uma linda paisagem. Um corpo nu. Invejo os desenhistas e seus desenhos perfeitos. Invejo os músicos e compositores e suas notas no ar. Traduzir os sonhos. É magia!

 

Tantos dons nas mãos dos artistas. Dons que não me deram. Então me sacio combinando palavras. Me contento escrevendo versos que só eu leio. Afagos egoístas em minha própria alma. Fico barrando minhas angústias daquilo que não sei fazer. Rabisco meus anseios em linhas indecifráveis. Triste como o mais tristes dos poetas. Sem palco. Sem vernissage. Sem talento. Sem aplauso. Preso em mim mesmo. Sufocado por um rancor de apenas ver. Jamais fazer. De ser apenas mais um que passa em meio aos milhares iguais a mim. Quem olha? Quem vê? Quem quer? Não. Não. Isso não importa! Existo. Respiro. Escrevo. Nada mais. Não. Nada mais. Apenas.

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